Não me deixe morrer, doutor, não me deixe morrer...

Você pode chamá-lo “John Doe”. Assim como no Brasil há o “Zé Mané”, nos Estados Unidos e no Reino Unido existe este pseudônimo generalizado se o nome verdadeiro de uma pessoa precisa ser resguardado por alguma razão ou se for realmente desconhecido.  Era o caso daquele indivíduo. 

Como podia prever que em 2020 uma pandemia varreria todos os continentes e chegaria à Califórnia onde morava? O fato é que como milhões de outras pessoas, ele também havia sido contaminado pela Covid-19. Era um homem corpulento, já maduro. O uso abusivo de metanfetamina, no entanto, tinha cobrado seu preço normal. John tinha uma aparência envelhecida e havia perdido todos os dentes. Ao chegar ao hospital, foi tirado da ambulância para ser atendido. Sofria uma forte falta de ar a despeito de já ter sido socorrido pelos paramédicos que lhe haviam ministrado oxigênio. Era uma experiência terrível. Mal podia respirar. Arfava angustiado enquanto a equipe do setor de emergência se preparava para atendê-lo. Com um medo enorme e voz sumida ele apenas conseguia sussurrar e repetir várias vezes:

– Não me deixe morrer, doutor, não me deixe morrer. 

Quando foi posto na maca e tiraram sua camisa para colocar o avental do hospital, a equipe ficou impactada. Eram muitos os símbolos de ódio nas tatuagens nazistas espalhadas em seu corpo. Elas denunciavam sua opção ideológica. Revelavam claramente que, como seguidor dela, ele acreditava na superioridade dos brancos de origem ariana e desprezava pessoas de outra ascendência. Os membros da equipe de atendimento se entreolharam. O terapeuta responsável por socorrer aquele paciente à beira da sufocação era asiático. A enfermeira era negra. O médico chefe da equipe, Dr. Taylor Nichols, era judeu! Todos se perguntavam: o que John Doe pensaria a respeito deles. Acaso lhes daria qualquer valor?  

Aquele paciente era nazista e não o escondia. Ao contrário, fazia questão de se gabar disso e ostentar os símbolos dessa ideologia. Um destes era a cruz gamada, assim chamada porque seus braços terminam em ângulo reto, como a letra gama, do alfabeto grego. Também conhecida por suástica, ela era uma tatuagem que ocupava grande parte de seu peito. John parecia usá-la com orgulho. Mas havia algo ainda mais grave. Seus braços estavam tatuados com símbolos semelhantes, especialmente o das “SS”, o terrível “Esquadrão de Proteção”, a organização paramilitar ligada ao Partido Nazista e a Adolf Hitler na Alemanha durante a Segunda Guerra Mundial. Esta havia sido uma das principais responsáveis pelo genocídio em que morreram cerca de 6 milhões de judeus, além de pessoas tidas por inimigas do nazismo. Apoiar esta ideologia já era uma coisa muito séria. Identificar-se com a “SS” muito pior. Era algo como afirmar-se um nazista feroz, impiedoso!  

Na mente do Dr. Nichols instalou-se o grande desafio. Salvaria aquele indivíduo que confessava apoiar uma filosofia baseada no orgulho racial e no ódio ao povo ao qual ele pertencia? E se os papeis fossem trocados e John Doe fosse o médico? Socorreria ele o judeu a quem desprezava, por quem nutria um ódio imenso?  

Descrevendo aquela situação disse o medico: “Aqui estávamos nós, trabalhando em equipe para garantir que lhe déssemos a melhor chance possível de sobreviver. Este momento capturou perfeitamente o que estamos atravessando como profissionais de saúde à medida que a pandemia se acelera. Nós vivemos em ciclos de medo e isolamento. Medo de ficarmos doentes na linha de frente. Medo de trazer o vírus para casa e expor nossas famílias. Medo de perder nossos colegas. Medo do aumento crescente de pacientes e de não termos o que precisamos para cuidar deles. Isolamento porque não queremos ser responsáveis ​​pela propagação do vírus, sabendo que estamos rodeados por ele todos os dias. Isolamento porque ninguém mais pode entender verdadeiramente esse sentimento, esses medos, o preço desse trabalho.”

O Dr. Nichols sublinhou não ter sido essa a primeira vez a ser confrontado por um paciente coberto de símbolos nazistas. “Tenho repetido como se fosse um mantra para mim mesmo: ‘eles vêm aqui precisando de um médico, Taylor, e você é um médico’. Em todas essas vezes tenho sido capaz de controlar minhas emoções serena e rapidamente”, afirmou ele. Ao me ver nessa situação, eu me sinto um pouco balançado, confesso”. No entanto, completou, “pela primeira vez em minha carreira, reconheço minha hesitação.” 

Ele perguntou a John Doe se permitiria a entubação para poder ser atendido. Sabia antecipadamente que isto seria inevitável e não havia outras opções. Entretanto, queria obter sua resposta antes que a queda nos níveis de oxigênio o deixasse mais confuso. Prometeu ao paciente tudo fazer, todo o necessário para salvar sua vida. O homem, sofrendo muito, quase em agonia, aceitou o procedimento se essa fosse a única opção para sua sobrevivência.   

Dr. Nichols e sua equipe repassaram entre si o plano de ação. John Doe foi entubado, estabilizado e sua hospitalização se concretizou. Eles nunca mais o viram. Precisavam seguir a rotina. Outros pacientes estavam a caminho. Dali a pouco chegaria outra ambulância... 

(para mais detalhes sobre esta história real:

https://www.washingtonpost.com/opinions/2020/12/05/taylor-nichols-er-patient-nazi-tattoo/?arc404=true ).

Comentários

  1. Essa semana assisti Leda Nagle, de forma cínica apresentar uma entrevista em que denunciavam 2 mortes em decorrência da vacina e uma paralisa facial. Recebi outra "entrevista" de um tal Dr. Andrew Wye PhD da Califórnia, informando ao mundo que não existe o o Covid 19 é um vírus imaginário. Que se trata do mesmo vírus da gripe H1N1, que somente mata quem tem comorbidades. Eu nunca havia entendido como um povo se deixa contaminar por uma liderança perversa, como na Alemanha, balançando bandeirinhas e aplaudindo-o, enquanto milhões eram mortos em campo de concentração. Sempre perguntava onde estava o Vaticano? onde estava a Igreja Luterana? Hoje eu passei a entender como isso funciona.

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    1. Se a gente apela à física (e vc deve ser mais expert que eu nisso) consegue encontrar um paralelo para entender a presença simultânea do mal e do bem numa mesma realidade. Temos que lembrar algo importante. Uma peça de aço imantado tem sempre dois pólos. Mesmo que vc a vá picando em pedacinhos, cada um deles mantém sempre estes pólos. O mono pólo só existe em micro frações do tempo.
      A realidade é sempre dual. Alguns profetas chegaram a admitir que Deus criou o mal, algo muito difícil de assimilar em nossas mentalidades não dialéticas, mas é a explicação mais apropriada para a coexistência destas duas coisas que em nossa mente são mutuamente exclusivas. Por isso é que as igrejas e os cristãos (inclusive a gente mesmo) aspira o bem mas não consegue superar o mal. Lutero já tinha dito que somos simultaneamente justos e pecadores...

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